24 de jan. de 2014

O maior presente que São Paulo me deu


O despertador nos acorda a água nos limpa, o café nos desperta e o transporte – seja carro, ônibus, bicicleta – nos leva até o trabalho depois de muito tempo presos no trânsito. Os colegas nos desejam bom dia, os e-mails nos lembram dos nossos afazeres do dia, o chefe nos cobra resultados. O estômago nos lembra que é a hora do almoço e o prato nos desafia a mantermos uma vida mais saudável para que possamos seguir firme nessa rotina. Rotina repetida dia após dia por paulistanos (natos ou por adoção) que em grande parte tem o mesmo pensamento: “Não dá mais para se viver em São Paulo!”. É praticamente um mantra do mundo contemporâneo que faz parte do cotidiano desses espectadores que veem a vida passar no ritmo frenético da maior metrópole do país.

A capital paulista – como todas as grandes cidades do Brasil – sofre com a poluição, há pouco investimento na educação e saúde, sofre com a violência, tem um dos piores índices de trânsito do planeta e toda aquela história que todos nós já sabemos. Mas será que quem mora em São Paulo apenas pensar nos problemas da cidade todos os dias?

Pensando nisso, resolvi que ao menos de alguma maneira eu tinha que descobrir o que os homens desta cidade pensam sobre ela. Ainda mais porque no próximo dia 25 de janeiro a antiga Vila de São Paulo de Piratininga comemora mais um ano de vida em 460 anos de história.


Em rápida pesquisa com 46 “manos de Sampa” perguntei: “Qual foi o maior presente que a cidade de São Paulo deu para vocês?”. Esperava uma enxurrada de respostas negativas – iguais às que vemos das águas da chuva de verão nas ruas e da debandada de gente nas estações de trem e metrô. Mas, a exemplo do que a cidade faz com as pessoas, fui surpreendido com as respostas.


“O fato de eu ter sido registrado aqui. Isso, pra mim, já foi um grande presente”

Grande parte de saudosistas guardam no coração a São Paulo de décadas passadas. “Dava gosto de olhar a Praça Marechal e ver lá longe o Banespa enquanto lambia um sorvete da casa Wiskie. Era um barato ir de bonde e descer na Matarazzo para visitar a Sears e pirar com o perfume de amendoins e castanhas. Era fantástico descobrir no Parque da Água Branca a origem do leite nosso do dia a dia. Aliás, leite deixado em nossas portas em garrafas de vidro. E ouvir o sino da São Geraldo, no Padre Péricles que lá ainda badala”.

Para muitos a cidade de fato é um grande celeiro de oportunidades e onde suas famílias conseguiram se estabelecer. Algumas, inclusive, são mais recentes e podem estar determinando como será a vida na metrópole nas próximas décadas, como “a possibilidade de pedalar e conhecer a cidade por outro ângulo”.

São Paulo dá milhões de oportunidades. E talvez essa seja o maior presente: ser o que desejamos ser!”

Há também bens materiais e culturais que são a marca de Sampa, como Adoniram Barbosa, o Corinthians, o Centro Velho, a Praça do Por do Sol, a USP, o Sambódromo, o Pacaembu, a Praça Benedito Calixto, a deselegância discreta das paulistanas, os Museus (que mesmo sem serem todos gratuitos e estarem sem os devidos cuidados, ainda moram no coração de seus moradores), a Estação da Luz, o estádio do Morumbi, os bares, os shows... Enquanto há moradores que também gostam de coisas simples, como “o prazer de caminhar com meu cão na Paulista”.

“O maior presente foi o fato de me permitir ter liberdade de locomoção, escolha e funcionar 24 horas/7 dias por semana nessa ‘cidade completa’. O que você precisar e quiser achar nela, você acha. Pouquíssimos lugares no mundo são assim, e tive a sorte de nascer, ser criado e morar em um deles”

Há quem se sinta presentado com grandes obras da capital, como “quando construíram o primeiro trecho do transporte metropolitano (Linha Norte-Sul) em meados dos anos 1970. Infelizmente, depois disso os próximos governantes não continuaram na marcha desejada de ampliação que deveriam”. E também “o novo cartão postal da cidade, a Ponte Estaiada, facilitando não só o meu trajeto como de muitos paulistas”.


“O melhor presente de São Paulo foram as ciclofaixas e ciclovias, tanto utilizando as principais avenidas e ruas (Paulista, Faria Lima, Ibirapuera) e também a que percorre o Rio Pinheiros”

Mas é claro que alguns lembraram os problemas da capital. Algo inevitável. Teve quem não pudesse considerar nada vindo da cidade como bens públicos deixando de lado bares, restaurantes, baladas, espaços culturais... Outra resposta foi mais objetiva: “Trânsito? Poluição? Corrupção? Não encontro nenhum presente digno”.

Por essa razão há quem entenda que a cidade deu um grande presente: a paciência. “Ao longo desses 30 anos de convívio aprendi a tolerar muita coisa, transito, desordem, violência. Por isso a cidade me ensinou a achar beleza, paz e tranquilidade mesmo no meio do caos”.

“Uma frase sobre São Paulo define bem esta metrópole: ‘A cidade não desperta, apenas acerta a sua direção’”, disse um dos pesquisados

Uma das histórias me chamou a atenção. Um ex-morador de rua que vendeu bala no farol e foi motoboy reconhece que apesar das dificuldades agradece pelas oportunidades que a cidade lhe deu. “Hoje trabalho no governo e através disso posso ajudar muita gente”, completou.

O que fica claro é que São Paulo tem com seus moradores uma relação existente apenas no seio familiar em que podemos morrer de amores por alguém ao mesmo em que reclamos dos erros cometidos por nossos entes queridos. E para mim essa é a grande marca mesmo da cidade tão amada quanto odiada.

“Um recomeço é sempre bem vindo nessa cidade, que nos ensina a viver em meio a tombos e tropeços e nos dá habilidade para sonhar grande nessa cidade onde vivemos, crescemos e nos formamos. Nela trabalhamos, amamos, sofremos, mas somos VIVO, tal qual a cidade ‘que nunca dorme’”

E para você qual foi o maior presente que a cidade lhe deu?

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